quarta-feira, 13 de maio de 2009

Chuvas de Verão

Como passava da hora, Vinícius Lamartine Vieira retornou à casa onde morava o mais rápido que pôde. Sendo assim, não teve tempo de olhar ao lado: a casa de número 23. No muro, apoiava-se aos domingos para olhar a psicina do vizinho que, além de ser um bolo para os domingos quentes e rachantes de Goiânia, vinha com recheio e cerejinha: Larissa de biquine.

Vinícius morava na 24 há doze anos e há doze anos brincara com Larissa durante um dia inteiro, o único na vida dessas flores mortas sem brilho, o suficiente para fazê-lo em seus poucos 14 anos apaixonar pelos cabelos louros e a cor branca alvíssima, quadril farto e corpo bem definido.

Parecia um moleque ao trepar no muro para espiar. Larissa quase nunca via e quase sempre estava acompanhada de seu namorado Rogério. Rogério rugiria se soubesse que Vinícius cortejava ao longe e fantasiava mais longe ainda a vida com Larissa. Vinícius imaginava muito mais do que qualquer dia junto de Larissa: imaginava estar dentro, desabrochar-se dentro dela, abrindo os botões negros, fechando os pulmões de ligeiro pra que carbônico não entrasse, não podia penetrar ar da atmosfera desse mundo, cuidaria então de limpar o rosto e de fazer cocégas no pé de Larissa... tirando-lhe as cépalas, o estame, androceu, gineceu e todo e qualquer gameta ou folha modificada que poderia ter.

Mas isso era muito sonho para uma realidade tão curta. E de tão curta, destino pior não teve: fora descoberto por Rogério, o qual, naturalmente, rugiu que todo o mundo, o mundo inteirinho, ouviu seu rugido feroz... era como se o Japão tivesse sido fragmentado por conta do rugido de Rogério há bilhões de anos, tão forte era e qual hálito tinha.

Não vendo outra opção, senão a de encarar o jovem leão, Vinícius bradou com forte braço e docente peito disse:

" Vejo moinhos e não dragões!"

Mas a citação falha, de quem apenas soube que Dom Quixote era de fato louco e perdeu o seu amor para sempre por ser louco ou fingia, sucitou na ira do leão que destroçou Vinícius. Coitado, passou 24 dias no hospital e só voltou pra casa no dia 13 de maio de 2009.

Nem viu o número 23 ao voltar pra casa. E antes de adentrar o portão ainda pensou em pensar no número, mas o que vinha a sua mente era, de fato, a surra recebida mês antes. Ignorou. Vinícius entrou em casa. Subiu o muro. Viu a psicina e encontrou Larissa chorando. A dama, ao perceber a presença do teimoso, vestiu sua nudez e exclamou:

" Quantos anos, Vinícius? Tive eu que olhar na sua direção para que quisesse um dia se importar comigo!"

Atônito e atarantado, Vinícius questionou:

" Fora você? Você quem deixara Rogério me humilhar, quebrar-me os ossos, bater-me a cara?"
" Sim, e agora que sabes? Que faras?"

Poderia ter feito o que quisesse, mas não fez. Preferiu se apoderar de sua solidão.

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